Sentada, concentrada em algo que não existe, de cabelos brancos e pele empalecida, alheia a tudo que se passa à sua volta, Conceição, 83 anos, está no mesmo banco, no mesmo lugar de todos os dias e, nem o alarido do entra e sai, típico de uma tarde de domingo no Lar, lhe desperta qualquer atenção.
Não existe ignorância ou desprezo, apenas o esquecimento de uma vida repleta de emoções que já passou, não acabou, mas na verdade, parece que já não existe.
A ausência de reconhecimento por quem passa à sua frente, é evidente.
Aos poucos Conceição foi deixando de conseguir fazer as coisas do seu dia-a-dia, vestir-se, alimentar-se, tratar da casa e da sua higiene. Há cerca de dez anos foi-lhe diagnosticada a Doença de Alzheimer (DA).
Amélia, 86 anos, residente do Lar-Hotel,em Trás-os-Montes, também sofre da mesma doença.
Viúva há muito pouco tempo, está ainda numa fase inicial. Encaminha-se para a sala de convívio, a muito custo, com a sua bengala, que a acompanha para todo lado, e com ajuda de uma auxiliar do lar, e de uma amiga que a foi visitar nesse dia.
Ainda conversa, no meio dos momentos de confusão em que o cérebro a trai. Pergunta por todos quantos se lembra. “Já casou, já tem filhos?”. Em pouco mais de meia hora fez, repetidamente, as mesmas perguntas, sobre as mesmas pessoas, como se nunca as tivesse feito. “Ela não dá pelo tempo passar” disse a amiga, que conhece a doença.
Alzheimer: Sintomas e características
Descoberta em 1906, por Alois Alzheimer, esta doença degenerativa, do foro mental, atinge maioritariamente pessoas acima dos 65 anos. As células do cérebro morrem lentamente, levando à sua atrofia. Apesar dos estudos e dos progressos na área da etiopatogenia da DA, ainda não existe tratamento eficaz na sua prevenção e cura.
São apontados alguns factores de risco, como a Tensão Arterial e Colesterol elevados, baixos níveis de estímulo intelectual, actividade social e exercício físico, obesidade e diabetes, graves ou repetidas lesões cerebrais. A idade continua a ser o maior factor de risco para a doença.
Silvia Marinho é Psicóloga, está a terminar o mestrado em Psicologia Clínica e da Saúde, e trabalha no Lar do Centro Social e Paroquial Divino, onde residem seis doentes de Alzheimer. “São acompanhados diariamente pela equipa técnica Assistente Social, Psicóloga, Educadora Social e Animadoras Sócio-Culturais”.
Na grande maioria dos casos, a perda de memória é o primeiro sinal a manifestar-se. A DA inicia-se no Hipocampo, local do cérebro onde as memória são formadas. Com o decorrer do tempo, e o avançar da doença, não só se torna difícil recordar coisas passadas, como se torna impossível formar novas memórias.
Muitas vezes, confundida com esquecimentos típicos da idade, não é levada a sério nem pelo doente nem pela família. Quando não explicados, os esquecimentos e confusões frequentes podem causar mal estar nos familiares e constrangimentos no próprio doente que chega até a esquecer-se do próprio nome.
Maria, a nora de Conceição, diz que na fase inicial, em que a doença não era conhecida, estranhava o facto de ela se esquecer de como faziam as coisas simples do dia-a-dia. “Ligava-me até para perguntar como se fazia o arroz”.
Não existe ainda um teste único capaz de diagnosticar esta doença, tem que ser feito por um Neurologista ou Psiquiatra. Este deve reunir informações relativas à natureza dos défices cognitivos apresentados pelo indivíduo, definir no tempo o início e a evolução da doença, caracterizar as alterações psicológicas e comportamentais, assim como avaliar o prejuízo que afecta a autonomia do indivíduo, explica Silvia.
É “importante referir que o diagnóstico da Doença de Alzheimer, é um diagnóstico por inclusão e não por exclusão de partes, apesar dos testes neuropsicológicos e as tecnologias de imagem apresentarem uma precisão de cerca de 90%, o diagnóstico só poderá ser confirmado após o estudo neuropatológico do tecido cerebral post mortem”, elucidou-nos a especialista.
A psicóloga refere que o resultado do diagnóstico deve dar-se à família, “pois será quem terá o papel de cuidador principal e serão estes quem irão proporcionar uma melhoria da qualidade de vida ao indivíduo”. O doente “tem direito à informação do seu estado de saúde” se estiver numa fase inicial da doença, ou seja, “quando se encontra num estado intelectual capaz de entender e de ajudar a definir situações que a família poderá ter que fazer no futuro, aliviando assim algumas decisões que a família teria que tomar sem saber a vontade do doente”.
Aliada à perda de memória está a dificuldade em transmitir o que sente. O doente não arranja palavras para exprimir-se. A comunicação torna-se cada vez mais difícil, a articulação de frases simples deixa de existir, até que deixa de haver comunicação.
Outro sintoma é a perda de sentido de orientação, tanto no tempo como no espaço. O doente deixa de conseguir reconhecer a casa onde mora e perde-se frequentemente. É, por isso, fundamental trazer sempre consigo algo que o identifique, uma placa, um cartão, com o nome, a morada e/ ou o contacto de alguém que possa ajudar.
O tempo torna-se confuso, começa a perguntar repetidamente a data, deixa de perceber em que altura do dia está, confunde as refeições, não se lembra se as fez ou não. Ficam esquecidas tarefas que se iam cumprir.
Haverá uma altura em que o doente mostra agressividade por não conseguir fazer tarefas simples, ou pensar que está a ser contrariado, “a agressividade pode ser a forma que estes doentes têm para manifestar dor, desconforto, ansiedade ou raiva e como tal, deve-se lidar com eles com calma, fazendo-os sentir-se amados e acarinhados”, aconselha Silvia.
Com a evolução da doença, a pessoa deixa de saber distinguir os sentimentos e emoções, tornando-se muita confusão na sua cabeça tentar perceber o que acontece à sua volta. Vão-se tornando cada vez mais dependentes e carecem de um cuidado e acompanhamento integrais.
Na última fase, a doença afecta a parte do cérebro responsável pela respiração e pelo funcionamento do coração.
Segundo dados da Associação dos Doentes de Alzheimer, em Portugal existem mais de 90 mil casos diagnosticados. A incidência desta patologia cresce com a esperança média de vida. “Uma em cada 20 pessoas acima dos 65 anos e uma em cada 5 pessoas acima dos 80 anos sofrem de demência, sendo a Doença de Alzheimer responsável por cerca de metade destes casos”, pode ler-se no site oficial.
Familiares dos doentes - cuidados
Não é fácil aceitar esta doença, há tendencia a “infantilizar” as pessoas que sofrem de Alzheimer.
Silvia Marinho deixa alguns conselhos e cuidados que se deve ter com o doente. “Deve ter o direito à saúde e ao estado funcional, manter a segurança e o conforto da habitação e a possibilidade de manter tarefas domésticas, ter sempre suporte social (família, amigos ou outros) disponível e atento,ter cuidado e apoio de profissionais adaptado ao indivíduo, manter os meios financeiros; estabelecer rotinas, respeitar a liberdade e a intimidade do doente".
Quem lida com o doente deve ser flexível. Este “passará por diferentes fases da doença e o cuidador deverá saber adaptar-se a essas mudanças”. É fundamental fazer um planeamento dos cuidados continuados para o futuro.
Existem cada vez mais actividades, formações, workshops, com o objectivo de ajudar quem tem que lidar com a Doença de Alzheimer.
Em baixo pode visitar alguns sites e recolher mais informações.
Fiquei sem palavras...poque esta reportagem trata um tema delicado...um tipo de doença que pode afectar toda a gente.Uma doença que é assustadora, principalmente quando sabemos os sintomas e as suas consequências.
ResponderEliminarAcho que o texto está maravilhosamente escrito cidália e a escolha deste tema foi uma boa ideia, porque dá imensa informação para as pessoas que por acaso estejam a passar por uma situação idêntica, ou para aquelas que um dia podem ter que lidar com algo do género.
Exelente ;)
ResponderEliminarNádia
é um tema mt delicado,mas tu saiste-t bem, pk para alem da doença,consegues mostrar o sofrimento k as pessoas de idade sofrem com o despreso das pessoas... ("A ausência de reconhecimento por quem passa à sua frente, é evidente.").
ResponderEliminartorna-s visivel como o carinho e a compreençao humana faz falta para estas pessoas, cuja a doença os torna meras marionetas no palco da vida...parabens
oi ci...
ResponderEliminarNunca duvidei que irias usar o coração para escrever acerca desta temática tão sensivel e complicada de abordar. Fizeste-o com elegância e os meus parabéns por escreveres não só como uma jornalista,mas como um ser humano com coração. soubeste manter a exactidão da área e mostras-te o quão boa és naquilo que fazes.